Moratória da soja: CNA pede a STF reversão de decisão que suspendeu investigações
São Paulo, 12 - A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) protocolou nesta quarta-feira, 12, petição no Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando a reconsideração da decisão liminar do ministro Flávio Dino que suspendeu todos os processos judiciais e administrativos relacionados à moratória da soja. O pedido visa principalmente assegurar a continuidade das investigações em andamento no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre possível formação de cartel no âmbito do pacto.
A moratória da soja é um acordo privado firmado em 2006 entre tradings, indústrias, organizações da sociedade civil e governo que proíbe a compra, o financiamento ou a aquisição de grãos produzidos em áreas do bioma Amazônia desmatadas após 22 de julho de 2008 - data de referência do Código Florestal. Cerca de 30 empresas são signatárias do pacto, que desde sua criação gera controvérsias entre produtores rurais e o setor industrial.
Na quarta-feira passada, 5, Dino atendeu ao pedido da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e determinou a suspensão nacional de todos os processos que discutem a validade do acordo. A decisão abrange não apenas ações na Justiça comum, mas também as investigações do Cade - que apuram se o pacto configura prática anticoncorrencial prejudicial aos produtores.
Na petição de 20 páginas, a CNA apresenta 20 argumentos para contestar a liminar. A entidade sustenta que a decisão é "nitidamente incabível" porque não há relação entre o objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7774 - que trata da constitucionalidade da Lei 12.709/2024 do Mato Grosso sobre concessão de incentivos fiscais a empresas signatárias de acordos como a moratória - e as investigações do Cade sobre possível cartel. "O objeto da presente ADI não é, direta, indireta ou tangencialmente, a legalidade da moratória da soja, mas sim a constitucionalidade de lei estadual que decide sobre critérios de concessão de benefícios fiscais ou prediais pelo Estado", afirma a confederação no documento.
A entidade defende que o Cade detém competência exclusiva e técnica para investigar se o pacto configura coordenação entre concorrentes. "O ponto central, portanto, em discussão naquela autarquia, é saber se um pacto firmado por agentes econômicos de grande porte, multinacionais, que concentram 87% (oitenta e sete por cento) do mercado de compra de soja no Bioma Amazônia, configura-se (ou gerou efeitos análogos a) um cartel de compras", diz a petição.
Segundo a CNA, as empresas signatárias estariam operando um mecanismo que uniformiza condutas comerciais e restringe a liberdade negocial dos produtores. "Sob o discurso de sustentabilidade, o pacto passou a operar como um mecanismo de uniformização de condutas comerciais, em que as tradings definem, em conjunto: (i) quem pode vender; e (ii) em que condições pode vender, impondo critérios privados que, na prática, substituem a legislação brasileira", afirma a confederação.
A CNA rebate especificamente a alegação da Abiove de que o STF teria reconhecido a legalidade da moratória ao julgar a ADI sobre a lei do Mato Grosso. "A frase utilizada por Vossa Excelência em seu voto quanto à moratória da soja é, quando muito, um obter dictum ou seja, uma expressão de passagem, um comentário não essencial que não tem força vinculante, mas é apenas o registro de uma impressão a priori quanto ao que foi mencionado na petição inicial", argumenta.
Na segunda-feira, 3, a Superintendência Geral do Cade havia instaurado inquérito administrativo para investigar 15 executivos e dirigentes de grandes tradings e associações do agronegócio por suspeita de formação de cartel no âmbito da moratória. A decisão de Dino suspendeu também esse procedimento, o que motivou a urgência do pedido da CNA.
O presidente do Cade, Gustavo Augusto Freitas de Lima, já havia manifestado ao Broadcast na sexta-feira, 5, a intenção de recorrer da decisão do ministro. Segundo ele, os pontos em discussão na ADI e nas investigações no Cade são distintos. "A Lei de Defesa da Concorrência não está em julgamento na ADI 7774. Por essa razão, parece que inquéritos para a investigação de prática de cartel, feitas com base na Lei 12.529, não deveriam ser interrompidas, principalmente quando estão em fase de investigação e quando envolvem uma conduta criminal", afirmou Gustavo Augusto.
Na decisão que concedeu a liminar, Dino argumentou que a suspensão busca conter a "litigiosidade exagerada" e insegurança jurídica sobre o tema. "O debate nesta ação de controle concentrado, e em outras similares, tem o mérito de buscar um marco jurídico seguro para todas as empresas do importante segmento do Agronegócio. É incompatível com essa virtude uma litigiosidade exagerada, com contendas múltiplas, transbordando precocemente, para outras instâncias judiciais e administrativas, conflitos entre empresas envolvendo bilhões de reais", afirmou o ministro.
A liminar vale até o julgamento definitivo da ADI 7774. O ministro submeteu a decisão para referendo do plenário em análise virtual que começa no dia 14 de novembro e vai até o dia 25. Na terça-feira, 4, o STF havia formado maioria de 7 votos a 3 para validar a lei mato-grossense, com efeitos a partir de 1º de janeiro de 2026.



